Esse projeto é um convite para quebrar o tabu. Um canal de inspiração e de informação para quem vive o luto e para quem deseja ajudar

Só alegria!

"Quando temos outros para auxiliar o nosso percurso, tudo fica mais fácil, qualquer dificuldade é aliviada pelo amor e pela reciprocidade daqueles que voam mais próximos de nós. É da natureza humana voar em bando” - escreveu Pedro Storani, um jovem que faleceu aos 22 anos e deixou como legado sua alegria e sabedoria

Pedro Storani

Sou professora da ESPM-Rio e, certo dia, soube que Pedro Storani, um dos alunos do curso de Publicidade e Propaganda, havia falecido aos 22 anos em decorrência de uma trombose na válvula aórtica. Embora ele já tivesse nascido com um problema no coração, gerando restrições físicas, levava uma vida relativamente normal: gostava de viajar, era apaixonado por música e tornou-se baterista de uma banda de amigos. Sua morte gerou uma comoção na faculdade porque ele era muito querido entre os colegas e bastante admirado pelos professores. Além disso, se engajava em projetos acadêmicos e tinha uma atuação destacada como estagiário da “Origem”, empresa Júnior da ESPM. Foram centenas de manifestações calorosas postadas nas redes sociais. Pedro estava prestes a concluir a faculdade e, na cerimônia de formatura, seus pais, Marcia e Paulo, e sua irmã Camila foram convidados para acompanhar o evento. Embora tenha sido extremamente doloroso olhar os colegas de Pedro no palco e não vê-lo fisicamente ali recebendo o seu canudo, eles não esperavam pela emocionante surpresa que os aguardava: todos os alunos entraram em cena vestindo a toga e um boné, marca característica de Pedro.

Para Marcia, o mais triste foi ver o futuro de Pedro ser descontinuado: “Pensava no Pedro e em tudo que ele “deixou de realizar” por conta do retorno… sofremos por tudo, pela ausência e por todos os sonhos interrompidos, por todos os planos feitos e não realizados…”.

Para Paulo, o mais duro foi não sentir-se preparado para enfrentar esta dor… ele conta que trabalhou 17 anos na polícia e 5 anos no BOPE, chegando a dar consultoria para o filme Tropa de Elite. O ex-capitão revela que, apesar de sua extenuante jornada de treinos ao longo de anos, nunca poderia imaginar que existisse algo que um dia ele pudesse qualificar, segundo suas palavras, de “pior que o pior…”. Ao longo de sua vitoriosa trajetória profissional, recebeu um treinamento físico e emocional extremamente árduo e desgastante (inimaginável para o cidadão comum) para enfrentar o pior cenário de violência. Ele e seus colegas eram obrigados a mergulhar em águas quase congeladas para fazerem o corpo resistir a situações de extrema pressão. Só conseguiam sobreviver se abraçassem uns aos outros porque o pouco de calor que restava no corpo de cada um era transferido em pequenas proporções para o outro, evitando a hipotonia e consequente morte. Fazendo uma analogia com o treinamento de Paulo, a família também descobriu que só conseguiria seguir adiante aquecendo-se mutuamente para atravessar o rio de tristeza que os congelou. E assim abraçaram-se não apenas fisicamente, mas também emocionalmente, com todas as forças para difundir a causa do Pedro: levar amor e alegria pelo mundo. Uma das características mais marcantes deste jovem era a sua leveza, o bom humor e a capacidade de enxergar a melhor qualidade de cada um, fazendo amigos por onde passava e demostrando estar sempre de bem com a vida. Pedro dividia pedaços generosos de sua essência com todos os que convivia e tinha um lema que repetia sempre, seja em momentos felizes ou difíceis: “Só alegria!”.

Revendo um vídeo que o próprio Pedro gravou para um trabalho que fez para a faculdade, observo que o título que ele deu é “meu voo”. E na introdução do trabalho ele explica: a minha primeira experiência com a natação foi interrompida por um problema no coração, mas foi superada por minha entrada no mundo da música”. Interessante analisar a sabedoria de Pedro. Quando uma porta se fecha, outra pode se abrir. Embora sua vida física tenha “se fechado”, quantas não terão se aberto com a disseminação de seu legado? Encontrei outra frase de Pedro que tem um significado profundo quando vemos como sua família aprendeu a lidar com a sua partida: “A verdade é que sozinhos, dificilmente chegamos aonde queremos. Quando temos outros para auxiliar o nosso percurso, tudo fica mais fácil, qualquer dificuldade é aliviada pelo amor e pela reciprocidade daqueles que voam mais próximos de nós. É da natureza humana voar em bando”. Sem dúvida, Paulo, Marcia e Camila aprenderam com Pedro a voar em bando. Se uniram aos demais familiares e amigos e decidiram transformar todos estes sentimentos em um movimento de ações filantrópicas e altruístas, compartilhando a mensagem de que era possível extrair forças do amor. Acreditaram na frase que Pedro escolheu para finalizar o vídeo que fez para a faculdade: “Continuarei eternamente a minha jornada junto daqueles que mais amo pois o meu voo nada mais é do que a busca eterna pela felicidade. E eu sei que a felicidade verdadeira só se consegue quando é compartilhada”.

Desde então, Paulo repete o lema que aprendeu na polícia: “missão dada, missão cumprida”. E assim, desta forma, leva adiante com Marcia e Camila a missão de contagiar outros corações tristes e sem esperanças. Os três já organizaram duas festas justo na data de aniversário do Pedro e as chamaram de “Só alegria 1” e “Só alegria 2”. Em ambas, as protagonistas foram crianças carentes convidadas para desfrutar desta iniciativa. Amigos íntimos de Pedro soltaram centenas de balões de gás rumo ao céu e compuseram músicas personalizadas em sua homenagem. Outros gravaram vídeos com depoimentos emocionantes e alguns prepararam camisetas com a ilustração de seu rosto e cartazes com frases de motivação que ele sempre repetia. Ainda no plano de perpetuar a essência de amor do filho, Marcia e Paulo doaram ao Hospital GRENDACC a reforma de um quarto infantil que passou a levar o nome de Pedro Storani.

Embora a família de Pedro já não possa acompanhar os eventos significativos que ele poderia viver aos 25, 35 ou 50 anos, penso na frase que Benjamin Meyers disse certa vez. “Triste não é morrer sem realizar todos os seus sonhos. Triste é viver sem ter sonhos para sonhar”. Portanto, Marcia, Paulo e Camila podem ter a certeza absoluta de que os 22 anos de Pedro valeram por 220 anos a 220 volts, tamanha foi a intensidade de sua presença positiva e a diferença que fez na vida dos demais. Foram 22 anos de muita energia e pura alegria!

 

Links de homenagens a Pedro Storani:

https://www.youtube.com/watch?v=cD172kFGgoU

https://www.youtube.com/watch?v=d2a5R4AqOi0

https://www.youtube.com/watch?v=ItFmYtL5Nm0

https://www.youtube.com/watch?v=QOQ4EvCzh-U

 

Ilustração família Storani

Observação: A menção dos nomes verdadeiros foi autorizada pela família.

Betty Wainstock é psicóloga, com Doutorado em Psicologia e Pós-Doutorado em Estudos Culturais, Professora da ESPM e Sócia do Instituto de Pesquisa Ideia Consumer Insights.