“Nunca mais seus olhos olharão para mim. Quando o mundo começa a se despovoar das pessoas que nos amam, pouco a pouco vamos nos transformando em desconhecidos, ao ritmo dessas mortes. Meu lugar no mundo estava no seu olhar e ele me parecia tão incontestável e eterno que nunca me incomodei em ver qual era”.

A escritora catalã Milena Busquets começa o seu livro Isso Também Vai Passar (Companhia das Letras) no funeral da sua mãe. A história segue com o seu primeiro verão do luto na casa de praia da família, na cidadezinha espanhola de Cadaqués. Milena expõe o que sente com a perda e a vida que segue a partir dela com crueza, humor, ironia e franqueza. Sua escrita fluente comove pela coragem de assumir seus altos e baixos, uma mistura da vontade de resgatar os prazeres do amor e do sexo com a constatação indignada de que a mãe nunca mais estará ali. É um livro que faz rir e chorar, retrato honesto de uma geração (a autora tem 44 anos) que aprendeu a viver livre e intensamente, estabeleceu novas relações familiares e acreditou na ilusão de ter controle sobre seus afetos. Diante do choque da morte, não sabe bem onde colocar a dor da ausência. Como descreveu lindamente (o livro é cheio de frases lindas) “Temo a morte dela e que este lado do mundo esteja ficando vazio demais, há dias que sinto o sopro dos meus mortos na nunca, como uma força silenciosa e orgulhosa que nos impele, mas há outros em que atrás e na frente só há precipícios”

O título é uma alusão à impermanência, tirada de uma história que a mãe lhe contou um dia, sentada em sua cama, para consolá-la da morte do pai: “Era uma vez, num lugar muito distante, talvez na China, um imperador poderosíssimo, sagaz e compassivo que um dia reuniu todos os Sábios do reino, filósofos, matemáticos, cientistas e poetas e disse a eles: “Quero uma frase curta que sirva para todas as ocasiões Possíveis, sempre”. Os sábios se retiraram e passaram meses e meses refletindo. Por fim, voltaram e disseram ao imperador. “Já temos a frase, é a seguinte: Isso também vai passar.